domingo, 8 de junho de 2008

Jogo Tácito

Pela primeira vez em 7 meses e 2 semanas o assunto desapareceu, em mais uma mesa de bar eles apenas se olham.
De frente um para o outro eles se observam, olhos nos olhos, calados.
Ela tem o cotovelo esquerdo apoiado à mesa segura, não só o queixo com a palma da mão aberta e com o dedo mínimo de encontro aos lábios, mas, tamém toda a sua postura ereta digna da bailarina que é. A outra mão movimenta incessamente o café com creme.
Ele com as pernas cruzadas e as costas totalmente apoiadas na cadeira, segura com a mão esquerda o cigarro que queima junto a um cinzeiro em forma de barco, tamanha é sua atenção àqueles olhos que o olham.
Ela, os longos cabelos presos num rabo-de-cavalo alto ressaltava na pele clara do pescoço duas pintas matematicamente alinhadas. A franja milimetricamente cortada contornava o rosto bem desenhado. O café esfriava.
Ele, cabelos curtos castanhos, quase raspados, barba de 3 dias que o deixava com cara de apaixonado e olhos, olhos enormes e profundos de cílios marcantes. O cigarro queimava.
Ele observava os olhos d'Ela. Eram olhos claros, azuis levemente acinzentados com contorno escuro e com as pupilas dilatadas pela pouca luz.
Olhos transparentes, na maioria das vezes serenos, olhos que sempre transmitiam claramente todas suas emoções.
Ao vê-los se sentia sempre seguro, porém , naquele momento, naquela noite Ele não conseguia precisar o que Ela sentia. Era um ohar neutro, não chegava a ser um olhar frio, era um olhar livre, sem sentimentos expressos.
Ela o observava, o analisava pelas verdadeiras janelas da alma. Janelas castanhas como a tempestade que chegava segundo a voz de Renato Russo e seu Tempo Perdido que o som ambiente os proporcionava.
Ela o olhava e calculava, 7 meses e 2 semanas são 224 dias, com aquele jovem sentado num café trajando bata indiana branca, jeans surrado e chinelos de couro.
Era muito tempo, muito tempo mesmo. Ela buscava agora o porquê de tanto tempo com Ele.
O café estava frio.
A brasa do cigarro já chegava até o filtro.
O silêncio continuava.
Ela ainda mexia o café já frio.
Ele ainda segurava o filtro em brasa.
Ambos sabiam que o menor movimento desencadearia um assunto, sabiam também, que não faziam questão de serem os responsáveis pelo seu começo.
A batalha continuava, eles se olhavam nos olhos.
Ele tinha agora o coração acelerado ao pensar o que falaria depois de tamanho exercício de silêncio.
Ela notara a tempestade agora formada nos olhos d'Ele, e sabia que não seria a perimeira a se mover.
O jogo estava travado.
Ela agora sentia um formigamento no ante-braço e Ele já não mais sentia a perna cruzada sobre a outra.
A brasa queimou o filtro e ele num movimento súbito soltou um balbucio do dor.
Ambos se olharam novemente e juntos como se houvessem ensaiado soltaram um uníssono
"Te amo!"