quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Chuva e Paixão

Dias de chuva são como uma paixão.
Espera-se muito por ela, daí de repente ela surge.
Contemplação, alegria e prazer, são sentimentos revelados diante de um acontecimento tão vital.
Vive-se num único dia o que cronologicamente deveria se viver em uma semana.
Aí vem o sofrimento, tudo que foi tão esperado, tão bom e arrebatador, se transmuta em dor, desespero e perda. O que era bom se torna prisão.
O tempo passa, sofre-se e quando menos se espera acaba.
E a liberdade volta abençoada pelo amarelo-alaranjado-contrastado-com-o verde-vivo-céu-azul-depois de chuva, um novo dia perfeito.

domingo, 27 de janeiro de 2008

Aquele Olhar

Ele entra pela porta e seu olhar não é o mesmo.
Não é o olhar de sempre, há um quê de desespero que torna nublado seu olhar sempre azul como céu limpo de inverno.
Para o desespero dela, aquele olhar transmite o desespero dele.
Ele passa por ela e vai para o quarto, mudo, com andar automático e com aquele olhar.
Por um milésimo de segundo ela pensa em mudar sua decisão, aquele olhar a faz se sentir a última das mortais sobre a face da Terra a espera do seu julgamento durante o juízo final.
Mais ela resiste, é a sua lei, o tempo dele tinha chegado ao fim, ela não poderia voltar atrás.
Da porta do quarto ela o vê no banheiro pelo reflexo do espelho, ele pega a escova de dentes e novamente ela vê seus olhos nublados.
Sua garganta trava, ela não vai chorar, ela sabe que não vai, não é primeira vez que acontece, mesmo sendo a primeira vez que vê um olhar tão desolado.
Ele junta as roupas, fecha a mala, olha ao redor.
Ela sai.
Ela não quer ver aqueles olhos, ela não quer se perder na nebulosidade deles.
Ele sai do quarto, como muitos outros já saíram, a lei estava sendo cumprida mais uma vez.
A mala, o silêncio, tudo como sempre, porém, os outros não tinham aquele olhar.
Ele se aproxima, ela pensa em falar algo, mais ela nunca disse nada, nunca era necessário, mais ela pensa em falar, falar para assim evitar aquele olhar.
O silêncio.
Ela desvia o olhar, mais ele delicadamente a ergue a cabeça segurando-a pelo queixo e o inevitável acontece, seus olhos se cruzam.
Ela procura o olhar de céu-azul-de-inverno (porque no inverno o céu fica muito azul e nenhuma nuvem aparece para escondê-lo), aquele olhar não existe mais. Existe no lugar um olhar nublado, desesperado, dissimulado, mas, com a mesma capacidade de enxergar sua alma, por isso ela o escolhera na multidão.
Ele a olha nos olhos e se vira deixando sobre a mesa de centro as chaves.
E sai, sem olhar para trás.
Ela o vê transpor a porta, silenciosamente como todos os outros e pela primeira vez ela chora.